O livro O silêncio do delator (selo A Girafa) narra, em sete vozes, o velório do líder de uma turma (a patota dos sovacões solidários do recruta Pepé) e de sua geração, que viveu plenamente as revoluções política e dos costumes dos anos 60 do séculoX X. O corifeu desse coro de narradores (intitulados com versos do samba A voz do morto, de Caetano Veloso) é o morto, um professor universitário de carreira profissional lograda, libido exacerbada e ideologia incerta. Desbocado, franco, rude, sem lim i tes, este comenta, direto do caixão, as visitas que recebe, tendo seus comentários interrompidos por narrativas em terceira pessoa do próprio velório, de encontros da turma no passado em torno de dois álbuns clássicos da música pop – Sergeant Peppe r ́ s lonely hearts club band, dos Beatles (1967), e Bringing it all back home, de Bob Dylan (1965) – e da trajetória de êxito e fiasco dos velhos amigos, um por um. Cada capítulo do romance se refere a uma das faixas desses dois discos e termina com uma estrofe do poema Inventário, de Pedro Paulo de Sena Madureira, do qual foi tirado o título da obra. Pelo velório passam a viúva historiadora, a mãe possessiva, a filha pragmática, o filho orientalista e os velhos amigos da patota: Paulo, o public itá rio bem-sucedido que não consegue se firmar como escritor da moda Marlon, o guerrilheiro-galã que se torna rico corretor do mercado financeiro Ricardo, militante comunista que vira ministro de Estado Jorge Carlos, astro do rock Helena, amiga de a dolescência com quem o morto viveu um caso fugaz e Pepé, artista plástico que termina mendigando. Além de Elsa, a Zuca, paixão 2 frustrada da vida do protagonista, e sua adorável filha Esmé, paródia da personagem do conto Para Esmé, com amor e sordi dez, de J. D. Salinger. O leit motiv do romance é o conflito entre o morto e a viúva: ele, adepto de Heráclito de Éfeso, orgulha-se da contribuição que sua geração deu ao gênero humano e ela, hegeliana, acredita que a história só se repete em ciclos .