Amador e amantes são palavras ambíguas. Donald Richie e sua perfeita tradutora Lúcia Nagib são amantes de uma cultura que fascina e enche os olhos ocidentais. De um Japão que nos assusta e nos encanta com seus ciclos obstinados de economia e dominação. Ao mesmo tempo, com um povo sedutor e fiel a rituais que resistem no tempo.Sabemos, no que o Japão nos toca e afeta, como é bom e privilegiado a uma cultura ser tangida lentamente por outra nos abrigos de seu próprio domínio. O mesmo distanciamento histórico que Donald Richie nos oferece com suas crônicas, várias gerações brasileiras experimentaram "invadindo" a cultura fechada da imigração japonesa no Brasil.O bairro da Liberdade, em São Paulo, é espelho fiel das mudanças que ocorrem no Japão original. Desaparecerão seus cinemas assim como totens sagrados, seus cineastas e pensadores ricos em resistência e instigação. Permanece uma cultura em constante transformação. Basta observar como Richie observa e nos passa este privilégio de mais de cinco décadas de experiência entre os japoneses. O mundo enganador da globalização quer diminuir o tempo das transações econômicas. Ritos e culturas não fazem parte do vocabulário. A viagem reveladora de Donald Richie é o antídoto que será sempre necessário para que a memória não seja traída por oportunismos da sobrevivência.Ao afastar-se das tropas americanas de ocupação e encantar-se com um novo mundo, mal sabia o jovem soldado Richie dos efeitos regeneradores de sua ação. Sem os seus registros - retratando escritores, cineastas, atores, até mesmo a imperatriz do Japão, e também pessoas comuns, mas tão reveladoras de uma cultura quanto seus compatriotas famosas - o pós guerra e o milagre econômico japonês teriam ainda uma leitura mais rica em ambigüidades e ainda mais pobre em tolerância humana.