Pouco antes de morrer precocemente, Franz Kafka, escritor obscuro e sempre depressivo, legou ao melhor amigo, Max Brod, escritor famoso e sempre animado, a tarefa de queimar a maioria de seus manuscritos, muitos deles inéditos. Max traiu Franz: não queimou nada, e quando morreu, décadas depois, havia deixado seu próprio legado — transformara o criador de “A metamorfose” no maior nome da literatura do século 20. Mas a história kafkiana dos papéis de Kafka estava longe de acabar.
"O último processo de Kafka" é um mergulho fascinante na origem, na importância inestimável e no destino de grande parte desses documentos, que por quase meio século, até 2016, juntaram pó num apartamento pequeno de Tel Aviv, desorganizados e cercados por inúmeros gatos, sem que se soubesse ao certo que tesouros havia neles. Combinando talentos de pesquisador, ensaísta, biógrafo e repórter, Benjamin Balint alterna seu olhar entre a trajetória de uma grande amizade (Brod conviveu por 22 anos com o homem que ele chamava de “milagre terreno”) e a longa batalha judicial de uma velhinha solitária contra poderosos interesses nacionais.
Afinal, quem é o legítimo dono do espólio do judeu de língua alemã que queria incinerar O processo? Israel, onde ele jamais pisou? A Alemanha, que matou suas três irmãs no Holocausto? Ninguém? A humanidade? Enquanto acompanha a busca por respostas para essas perguntas, o autor investiga universos — as artes, o mercado editorial, a pesquisa acadêmica, os museus, as bibliotecas, os tribunais, o judaísmo, o nazismo, o exílio, a linguagem, o materialismo — que foram profundamente marcados por uma única pessoa. Numa obra indispensável para quem lê ou pretende ler o autor das mais sagradas escrituras da modernidade, Balint nos mostra o quanto, sem Kafka, nosso mundo seria outro.