Rafael Gallo, um dos escritores mais potentes da literatura brasileira contemporânea, vencedor do Prêmio José Saramago (2022), do Prêmio São Paulo de Literatura (2016) e do Prêmio Sesc de Literatura (2012), retorna ao seu gênero literário de origem com o livro de contos inéditos Cavalos no escuro.
Nascido e criado na fazenda, filho dos antigos caseiros de seu Fortunato, Pedro passou a vida em completa e cega devoção ao patrão e ao trabalho com os animais. Contudo, após algum tempo de seu casamento com Joana, a pacífica dedicação às suas obrigações na propriedade é abalada pelo relinchar desesperado e constante dos cavalos no estábulo, onde a mulher e seu empregador, toda noite, passam um tempo sozinhos, a “tratar” dos bichos. Inquietante, “Cavalos no escuro” é a porta de entrada para o que nos espera nos outros nove contos desta obra, todos tão profundos e mordazes quanto o primeiro, que dá título ao livro.
“Fundo falso”, “Anjo caído”, “O risco na água” e “Fábrica de nuvens”, por exemplo, exploram a densidade das relações humanas, o mundo existente dentro e fora de nós, mostrando que tudo o que pertence a nós afeta o outro, e, sobretudo, que muito do que dizemos e fazemos é dotado de hipocrisia. Em outras histórias, somos reapresentados à angústia de se viver buscando a própria identidade: “Às vezes, parece que a gente nasce afastado da gente mesmo, e é preciso percorrer uma longa distância até alcançar seu Eu”, diz a personagem de “Diário de Transbordo #99”.
Em comum, todas as narrativas de Cavalos no escuro apresentam personagens marcantes, envoltas em suas próprias cegueiras, insuficiências e compulsões, obsessões e dificuldades. Essa capacidade de Rafael Gallo estruturar uma prosa eletrizante do início ao fim tem sido amplamente elogiada ao longo de sua carreira. Nélida Piñon escreveu que o autor é “um herdeiro das portas da imaginação que Homero abriu”. E Adriana Lisboa afirma, no texto de orelha deste Cavalos no escuro: “Rafael Gallo é um mestre na construção dessas figuras inesquecíveis, que permanecem conosco muito depois de finda a leitura.”